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Foto do escritorEliza Edgar

Quem sabe, faz a hora.

Análise de Não deixe para amanhã, de Jade Sand.

"Um vento frio circulava dentro de minha barriga devido à ansiedade. Eu trabalhava desde os dezesseis anos, mas cada emprego era como se fosse o primeiro. Eu estava com medo, mas estava animado. Eu gostava de desafios."


Ainda que poucos assumam, muitos amam anti-herois. Não é difícil de entender o porquê, afinal, é nosso arquétipo catártico, o que espelha e assume nossas atitudes impróprias e banca nossos pensamentos obscuros.

É o tipo de personagem que, por mera existência, faz o enredo e enche a história. O livro que trago hoje está repleto de personagens desse jeito.


"Um leve tremor me atingiu. Será que ele ia finalmente me substituir? Será que minha audácia em falar de assuntos pessoais e constrangedores tinha contribuído para isso?"


Randrew Marques tem dezenove anos e é novo na empresa em que trabalha como auxiliar administrativo. É o funcionário que todo patrão gostaria de ter, visto sua proatividade. Porém a mão que afaga é a mesma que apedreja; logo a eficiência do rapaz passa a chamar a atenção de todos da firma, em especial, de seu chefe, Álvaro Resende.

Álvaro é o tipo de chefe que mantém uma relação amistosa com os funcionários, preocupando-se com o bem-estar deles, mas sem deixar de exigir disciplina em sua empresa. Não demora para surgir rumores de que Álvaro tenha segundas intenções com Randrew, assunto que, ao tempo em que é motivo de júbilo para alguns, é de rixa para outros. Randrew acaba, de fato, se aproximando além do devido de Álvaro, e é aí que o bicho começa a pegar.


"Há diferenças entre ficar com uma pessoa e dormir com ela. Eu tinha dormido com Álvaro e ainda estava ali, entre seus braços, depois de bons momentos de prazer e algumas horas de sono. Sem me mover, senti o cheiro que vinha do corpo dele, delicado, convidativo. Sua correntinha fina e dourada caía para um lado, e eu via apenas parte dela. Depois a clavícula, parte da garganta, o queixo com uma barba que começava a arranhar."


Impossível ler um livro de Jade Sand e não comentar sobre os personagens, todos sempre incrivelmente bem construídos e capazes de nos proporcionar diversos tipos de emoções. Randrew é um típico garoto recém-saído da adolescência, tem um Q de idealista ao tempo que só consegue olhar para o próprio umbigo. Já Álvaro é sistemático, inseguro e emocionalmente dependente. Tais características tão distintas de ambos e, de certo modo, opostas, são a razão e o tempero dos inúmeros conflitos entre os dois.

E não só os protagonistas, os personagens secundários são um show à parte. Destaque para Seu Antônio e sua língua solta (vivo dizendo que autores não são nada sem os personagens fofoqueiros, gente!).


"Há diferenças entre ficar com uma pessoa e dormir com ela. Eu tinha dormido com Álvaro e ainda estava ali, entre seus braços, depois de bons momentos de prazer e algumas horas de sono. Sem me mover, senti o cheiro que vinha do corpo dele, delicado, convidativo. Sua correntinha fina e dourada caía para um lado, e eu via apenas parte dela. Depois a clavícula, parte da garganta, o queixo com uma barba que começava a arranhar."


Pode até soar clichê, mas a autora tem uma escrita limpa e fluida, de um jeito que te prende nas páginas; e isso é importante destacar, pois há quem associe isso a um "texto pobre", coisa que, definitivamente, o livro não é. Existe todo um cuidado de se descrever detalhes mínimos, porém que provocam todo um efeito na trama, pesando o enredo, amarrando-o, tornando-o deliciosamente sombrio e provocativo.

Foi um livro que li duas vezes, e confesso que tive percepções diferentes dos personagens a cada vez. Isso porque, além de anti-herois, os personagens de Não deixe para amanhã são esféricos, ou seja, possuem nuances cinzentas, então a interpretação deles dependerá de como e quando você ler o livro, que está disponível no KU.

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2 commentaires


Jade B. Sand
Jade B. Sand
24 juil. 2021

Adorei a parte dos personagens fofoqueiros. Uma grande verdade hahaha. Obrigada pelas lindas palavras.

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Eliza Edgar
Eliza Edgar
24 juil. 2021
En réponse à

Hahahaha, né

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